Novo documento do Vaticano sobre a Inteligência Artificial (IA) reafirma “nova relação da humanidade com a tecnologia” que deve provocar “uma nova sabedoria do coração”
«Antiqua et nova» [Antiga e Nova] é o novo documento do Vaticano, assinado pelo prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, D. Víctor Fernández e D. José Tolentino Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação.
O extenso documento reafirma o compromisso da Igreja como “promotora dos progressos da ciência, da tecnologia, nas artes e em todos os empreendimentos humanos, vendo-os como parte da «colaboração do homem e da mulher com Deus no aperfeiçoamento da criação visível”, e lembra os desafios que “a IA traz consigo na relação da humanidade com a tecnologia”.
“Hoje é de extrema importância considerar as suas implicações antropológicas e éticas, não só no mitigar dos dados, mas para garantir que as suas aplicações se destinam a promover o progresso humano e o bem comum”.
O documento, dirigido aos responsáveis cristãos, exorta “padres, professores, agentes de pastoral e bispos”, a “dedicar atenção e cuidado a esta questão urgente” e foi escrito “em linguagem acessível” para que todos “sintam a exigência de um desenvolvimento científico e tecnológico que esteja ao serviço da pessoa e do bem comum”.
Criticando a concentração de recursos de IA em “empresas poderosas”, o texto lembra que nenhum humano “consegue ter uma supervisão completa dos vastos e complexos conjuntos de dados utilizados para a computação”.
“Esta falta de responsabilidade bem definida gera o risco da IA poder ser manipulada para benefício pessoal ou empresarial, ou para orientar a opinião pública para os interesses de um sector”, lê-se.
Disponível em italiano, inglês e espanhol, «Antiqua et nova» alerta para a possibilidade de se estar a “criar um substituto de Deus”.
“Em última análise, não é a IA que é deificada e adorada, mas o ser humano, que se torna, assim, escravo do seu próprio trabalho”.
O documento reflete sobre as raízes filosóficas e teológicas do conceito de ‘inteligência’ e os desafios e impactos que a IA traz hoje em áreas como a educação, o trabalho, a saúde, a espiritualidade ou a guerra.
Lembrando que a IA está confinada a um domínio “lógico-matemático, o que lhe impõe certas limitações inerentes”, o Vaticano reforça a ideia de que “a busca da verdade alcança a sua máxima expressão na abertura das realidades que transcendem o mundo físico e criado”.
Debruçando-se sobre a educação os responsáveis do Vaticano lembram que “a utilização extensiva da IA na educação pode levar a uma maior dependência dos estudantes em relação à tecnologia” e contrapõem com uma necessária “relação indispensável entre professor e aluno”.
“É necessário que os utilizadores todas as idades, mas sobretudo os jovens, desenvolvam uma capacidade de discernimento na utilização dos dados e conteúdos recolhidos na Internet ou produzidos por sistemas de inteligência artificial”, desenvolvem.
Pedindo algoritmos “fiáveis”, os responsáveis da Santa Sé apontam o “elevado grau de subalternidade em relação à tecnologia que caracteriza a sociedade contemporânea”.
A nota alerta para a “antropomorfização da IA” e defende que nenhuma aplicação é “capaz de sentir verdadeiramente empatia”.
Num mundo cada vez mais individualista, há quem se tenha virado para a IA em busca de relações humanas profundas, de simples companheirismo ou mesmo de laços emocionais”.
Relativamente aos cuidados de saúde, o Vaticano saúda os avanços na área do diagnóstico e tratamento, mas rejeita que os doentes passem a “interagir com uma máquina em vez de um ser humano”.
O texto reflete ainda sobre o campo da educação, falando numa “relação indispensável entre professor e aluno”, particularmente perante uma “cultura largamente digitalizada”.
“A utilização extensiva da IA na educação poderia levar a uma maior dependência dos estudantes em relação à tecnologia”, indicam os responsáveis da Santa Sé.
É necessário que os utilizadores todas as idades, mas sobretudo os jovens, desenvolvam uma capacidade de discernimento na utilização dos dados e conteúdos recolhidos na Internet ou produzidos por sistemas de inteligência artificial”.
Este não é o primeiro pronunciamento do Vaticano sobre a IA. Em 2023 o Dicastério para a Cultura e Educação disponibilizou o documento «Ethics in the Age of Disruptive Technologies: An Operation Roadmap» [ndr: Ética na Era das Tecnologias Disruptivas: Um Roteiro de atuação»].
Já em 2024 o Papa Francisco participou no encontro dos sete países mais industrializados do Mundo e aprofundou o tema a partir da perspetiva da Igreja Católica.
Imagem: Unplash
Educris|28.01.2025