12 anos de Francisco: «Papa Francisco, o Primeiro Catequista da Igreja», padre Márcio Martins
Foram 12 anos de Pontificado que deixam marcas visíveis para a catequese da Igreja. O padre Márcio Martins, diretor do Secretariado Diocesano da Educação Cristã da Diocese de Vila Real, partilha com os leitores da Educação Cristã (EDUCRIS), o legado e os desafios que Francisco deixa a catequese portuguesa
Neste ambiente pascal, como Igreja celebramos a centralidade da nossa fé: o grande anúncio e as verdades que a Igreja tem para oferecer ao mundo — verdades que o Papa Francisco, de forma pragmática e querigmática, definiu na Exortação Apostólica pós-sinodal Christus Vivit, sobre os jovens, onde refere essas verdades fundamentais: “Deus ama-te, Cristo salva-te, Ele vive” (cf. 112-131). Estas verdades não se dirigem apenas aos jovens, mas a todos os cristãos. São verdades que, numa catequese que deve ser sempre renovada e querigmática, devem ser proclamadas sem medo, com desassombro, como verdade maior para a humanidade.
O Papa Francisco tinha um sonho. Esse sonho está plasmado na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. Objetivamente, esse sonho é o de uma Igreja que viva e encarne esse Evangelho na realidade do presente — uma atualização sempre viva e eficaz da Palavra, que ilumina, desconcerta, desinstala e nos compromete. Uma Igreja em saída, sem medo da lama, mas levando apenas Jesus a todas as periferias. Quer também ser um despertador da nossa consciência missionária: não apenas sermos discípulos do Mestre, mas missionários dos Seus ensinamentos.
A Evangelii Gaudium deixou ainda desafios claros para os catequistas: a alegria de viver e anunciar Jesus. A importância da catequese, como de todo o processo pastoral, exige um acompanhamento personalizado e humanizado — não anunciar verdades de forma descontextualizada, mas acompanhar e animar o processo de descoberta de Deus. Uma catequese querigmática e mistagógica, visível no capítulo quarto, intitulado “Uma evangelização para o aprofundamento do querigma”, foi o mote inspirador do novo Itinerário de Iniciação à Vida Cristã das Crianças e dos Adolescentes com as Famílias, da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP). Este é o documento orientador para a catequese, elaborado com base nos documentos da CEP, no novo Diretório de Catequese (2020), e numa análise da realidade da catequese em Portugal, respondendo aos vários apelos de mudança de paradigma e aos desafios pastorais da atualidade.
Outra marca indelével do pontificado do Papa Francisco foi a possibilidade de as mulheres acederem aos ministérios laicais, como antecâmara de outro passo importante na renovação da catequese: o motu proprio Antiquum Ministerium (2021), que estabelece o Ministério Laical do Catequista. Desde a primeira notícia da publicação deste documento, já se sabia que o Papa tinha este tema no seu coração há vários anos. Em 2013, num discurso aos catequistas em peregrinação a Roma, por ocasião do Ano da Fé e do Congresso Internacional de Catequese, o Pontífice expressou a ideia central do Ministério do Catequista: “Ser catequista! Não trabalhar como catequista”.
O documento final do Processo Sinodal 2024, Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão, reforça a importância dos “carismas,da vocação e dos ministériospara a missão” (cf. 57-78). Nele se afirma que o catequista deve renovar todos os dias a sua vocação, que brota do batismo, mas que se amplia no serviço e na missão de provocar o encontro com Cristo. Uma definição clara da missão da catequese e do catequista, sublinhando o seu papel alargado na vida eclesial em tantas geografias, mas sempre com o mesmo fim.
Outro marco importante do sonho do Papa Francisco é o Processo Sinodal, iniciado em 2021 — e que se deseja contínuo como método da própria Igreja —, culminando em 2024 com a Assembleia Ordinária em Roma e com a publicação do documento final: Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão. O objetivo primordial do processo sinodal é mudar a lógica de ser Igreja. A Igreja existe apenas para evangelizar, e esse processo de evangelização deve chegar a todos, como Igreja que acolhe e tem lugar para todos.
O regresso às origens, como já foi referido, é uma oportunidade de alterar o paradigma de ser Igreja, numa linha de comunhão, participação e missão. A comunhão, de um povo que partilha uma só fé, com as mesmas raízes no amor de Deus Uno e Trino, onde a força vivificante do Espírito nos faz perceber o papel comum no discernimento e na vivência do chamamento de Deus.
A participação é a consciência de que Deus chama todos, sem exceção (leigos, consagrados e ministros ordenados), para que, numa atitude de escuta e respeito pela diversidade e unidade deste caminho sinodal, se viva a corresponsabilidade: “a participação fundamenta-se no facto de todos os fiéis estarem capacitados a serem chamados a colaborar ao serviço uns dos outros com os dons que cada um recebeu do Espírito Santo (…) Na Igreja sinodal, toda a comunidade, na livre e rica diversidade dos seus membros, é convocada a rezar, escutar, analisar, dialogar, discernir e aconselhar na hora de tomar decisões pastorais mais de acordo com a vontade de Deus” (cf. Comissão Teológica Internacional, A sinodalidade na vida e na missão da Igreja, 67-68).
Quanto à missão, devemos desde logo entender que a identidade e finalidade da Igreja é evangelizar — não uma Igreja centrada em si mesma, mas centrada no Evangelho e em Jesus. Uma das marcas deste caminho sinodal é precisamente a missão. Ser cristão encontra o seu verdadeiro sentido no testemunho levado às periferias do nosso tempo — espirituais, sociais, económicas, políticas, geográficas e existenciais — com um verdadeiro desejo de que a Igreja, neste processo, consiga chegar a todos. A sinodalidade é sempre este caminho integrador, que purifica e afina o que realmente é e deve ser a missão — e também a missão da catequese.
O último grande legado do Papa Francisco é a Esperança. Neste Ano Jubilar que estamos a celebrar, somos desafiados a renovar a nossa esperança cristã, sempre numa linha pascal. Na Bula de proclamação do Jubileu Ordinário de 2025, Spes non confundit, somos convidados a ser peregrinos da esperança. E essa esperança também não pode faltar na nossa missão de catequistas nas nossas comunidades. Essa foi a força do Papa Francisco: viver com esperança no mundo e na Igreja. Porque a esperança vem de Deus — “a esperança não engana” (Rm 5,5).
Falta muitas vezes essa fortaleza aos catequistas de hoje: olhar para a sua missão sempre com os olhos da esperança. Não com um otimismo pueril e ilusório de que tudo correrá bem, mas com a confiança de que apenas temos de lançar a semente e esperar que a graça de Deus e a Sua providência a façam germinar — em frutos que não são nossos, mas de Deus.
Papa Francisco, o Primeiro Catequista da Igreja — título que dá corpo a esta partilha — é, para nós catequistas da Diocese de Vila Real, uma luz serena que ilumina o caminho e aquece o coração. A sua vida entregue à missão, a sua fidelidade alegre ao Evangelho, e o seu olhar sempre atento ao irmão esquecido, ao ferido da beira do caminho, são para nós faróis que guiam o nosso ser e agir eclesial.
Na simplicidade dos encontros, no silêncio da escuta e no ardor do anúncio, somos chamados a seguir este trilho de humanidade e de fé. Humanizar as nossas catequeses é permitir que nelas habite o sopro do Espírito, que transforma relações e renova corações.
Atendendo ao chamamento de S. Paulo, e a exemplo de Francisco, também nós queremos dizer com a vida: “Ai de mim se não evangelizar” (1 Cor 9,16). Que este apelo se faça oração, missão e esperança viva nas nossas comunidades, onde cada catequista seja presença que conduz ao encontro com Cristo vivo, fonte de toda a beleza e verdade.