Audiência-geral: «O Deus cristão é uma unidade de comunhão, de amor», afirma o Papa
Em nova catequese sobre «O Espírito Santo e a Noiva» Francisco convidou os fieis a um percurso sobre o modo como a Igreja, ao longo dos séculos, aprofundou a profissão de fé no Espirito Santo.
O texto abaixo inclui também partes não lidas que são apresentadas como pronunciadas
Ciclo de catequese. O Espírito e a Noiva. O Espírito Santo guia o povo de Deus ao encontro de Jesus, a nossa esperança. 10.º “O Espírito, dom de Deus”. O Espírito Santo e o sacramento do matrimónio
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Da última vez explicámos o que proclamamos sobre o Espírito Santo no credo. A reflexão da Igreja, porém, não se ficou por esta breve profissão de fé. Continuou, tanto no Oriente como no Ocidente, através da obra de grandes Padres e Médicos. Hoje, em particular, gostaríamos de recolher algumas migalhas da doutrina do Espírito Santo desenvolvida na tradição latina, para ver como ela ilumina toda a vida cristã e em particular o sacramento do matrimónio.
O principal arquiteto desta doutrina é Santo Agostinho, que desenvolveu a doutrina do Espírito Santo. Parte da revelação de que “Deus é amor” (1Jo 4.8). Ora, o amor pressupõe quem ama, quem é amado e o próprio amor que os une. O Pai é, na Trindade, aquele que ama, fonte e princípio de tudo; o Filho é aquele que é amado e o Espírito Santo é o amor que os une [1]. O Deus dos cristãos é, pois, um Deus «único», mas não solitário; esta é uma unidade de comunhão, de amor. Nesta linha, alguém propôs chamar ao Espírito Santo, não “terceira pessoa” do singular da Trindade, mas antes “primeira pessoa do plural”. Ele, por outras palavras, é o Nós, o Nós divino do Pai e do Filho, o laço de unidade entre as diferentes pessoas [2], o próprio princípio da unidade da Igreja, que é precisamente um «corpo único» resultante de várias pessoas.
Como disse, hoje gostaria de refletir convosco em particular sobre o que o Espírito Santo tem para dizer à família. O que poderá o Espírito Santo ter a ver com o casamento, por exemplo? Muito, talvez o essencial, e tento explicar porquê! O matrimónio cristão é o sacramento do homem e da mulher que se fazem dom um para o outro. Assim pensava o Criador quando «criou o homem à sua imagem […]: homem e mulher os criou» (Gn 1,27). O casal humano é, pois, a primeira e mais elementar realização da comunhão de amor que é a Trindade.
Os cônjuges devem também formar a primeira pessoa do plural, um “nós”. Estar perante o outro como um “eu” e um “tu”, e perante o resto do mundo, incluindo as crianças, como um “nós”. Como é bonito ouvir uma mãe dizer aos filhos: “O teu pai e eu...”, como Maria disse a Jesus quando o encontraram aos doze anos no templo a ensinar os Doutores (ver Lucas 2: 48), e ouvir um pai dizer: “A tua mãe e eu”, quase como se fossem um único sujeito. Quanto os filhos precisam desta unidade – pai e mãe juntos –, a unidade dos pais e quanto sofrem quando ela falta! Quanto sofrem, quanto sofrem os filhos de pais que se separam!
Para corresponder a esta vocação, porém, o matrimónio necessita do apoio d’Aquele que é o Dom, ou melhor, da doação de si mesmo por excelência. Onde entra o Espírito Santo, renasce a capacidade de doação. Alguns Padres da Igreja afirmaram que, sendo o dom mútuo do Pai e do Filho na Trindade, o Espírito Santo é também a razão da alegria que reina entre eles, e não tiveram medo de usar, ao falar sobre isso, a imagem dos próprios gestos da vida conjugal, como beijar e abraçar [3].
Ninguém diz que tal unidade é um objetivo fácil, muito menos no mundo de hoje; mas esta é a verdade das coisas tal como o Criador as pretendeu e está, por isso, na sua natureza. É claro que pode parecer mais fácil e precipitado construir na areia do que na rocha; mas Jesus diz-nos qual é o resultado (ver Mt 7,24-27). Neste caso, então, nem sequer precisamos da parábola, porque as consequências dos casamentos construídos na areia estão, infelizmente, à vista de todos e são sobretudo os filhos que pagam o preço. Os filhos sofrem com a separação ou falta de amor dos pais! O que Maria disse a Jesus em Caná da Galileia deve ser repetido por muitos esposos: “Não têm vinho” (Jo 2,3). O Espírito Santo é quem continua a fazer, a nível espiritual, o milagre que Jesus fez naquela ocasião, ou seja, transformar a água do hábito numa nova alegria de estarmos juntos. Não é uma ilusão piedosa: foi o que o Espírito Santo fez em muitos casamentos, quando os esposos decidiram invocá-lo.
Não seria mau, portanto, se, juntamente com as informações de natureza jurídica, psicológica e moral que são fornecidas, esta preparação "espiritual", o Espírito Santo que cria a unidade, fosse explorada com maior profundidade na preparação dos noivos para o casamento. “Entre marido e mulher não metas dedo”, diz um provérbio italiano. Em vez disso, existe um “dedo” a ser colocada entre a esposa e o marido, e é precisamente o “dedo de Deus”: isto é, o Espírito Santo!