Quaresma 2012

Conforme é já tradição no seio da Igreja Católica, poucas semanas antes do início da Quaresma é publicada a mensagem do Santo Padre para esse tempo litúrgico. O texto destina-se primeiramente aos católicos mas, em última análise, é dirigida a todas as pessoas de boa vontade que queiram reflectir acerca da mensagem cristã que é destacada em cada um dos anos.
Esta é já a sétima mensagem quaresmal redigida por Joseph Ratzinger enquanto Sumo Pontífice. As primeiras apontavam directamente para Jesus, relacionando-o com atributos desde há muito associados à Quaresma e à Páscoa. Foi assim em 2006, sob o lema «Jesus, ao ver as multidões, encheu-Se de compaixão por elas» (Mt 9, 36) e depois em 2007 quando se reflectiu acerca da própria paixão com a passagem «Hão-de olhar para Aquele que trespassaram» (Jo 3, 37). Em 2008 e 2009 fomos chamados a interiorizar os valores da esmola e do jejum seguindo as passagens «Cristo fez-Se pobre por vós» (2 Cor 8, 9) e «Jejuou durante quarenta dias e quarenta noites e, por fim, teve fome» (Mt 4, 2). Nos dois últimos anos as mensagens centraram-se na fé e na justiça [2010: «A justiça de Deus está manifestada mediante a fé em Jesus Cristo» (Rom 3, 21–22)] e também no mistério da ressurreição à luz da morte em Cristo [2011: «Sepultados com Ele no baptismo, foi também com Ele que ressuscitastes» ( Cl 2, 12)].
Arriscaria dizer que a mensagem deste ano é aquela que mais facilmente encontrará eco na generalidade das pessoas de “boa vontade”. Ao contrário dos anteriores, o lema escolhido para a mensagem não menciona explicitamente qualquer das Pessoas da Santíssima Trindade e, em tempo de crise, parece até querer apontar caminhos de edificação não só pessoal como também comunitária.
«Prestemos atenção uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras» (Heb 10, 24) foi a passagem escolhida por Bento XVI para a reflexão deste ano. Sem deixar de apresentar a Quaresma como “tempo propício”, “oportunidade para reflectir”, “percurso” e “tempo santo de preparação para a Páscoa”, o Santo Padre divide a mensagem em três grandes grupos: um dedicado à responsabilidade pelo outro [«Prestemos atenção»],

o segundo ao dom da reciprocidade [«Uns aos outros»] e o terceiro ao caminhar juntos na santidade [«Para nos estimularmos ao amor e às boas obras»].
No que respeita ao tema da responsabilidade pelo outro, Bento XVI denuncia aquilo que chama de “indiferença e desinteresse, que nascem do egoísmo, mascarado por uma aparência de respeito pela «esfera privada»”. Recorda também um aspecto da vida cristã que parece algo esquecido: a correcção fraterna. O Santo Padre afirma que esta boa prática era muito comum nos primeiros tempos da Igreja, tal como o é ainda hoje em “comunidades verdadeiramente maduras na fé”. Todavia adverte para o modo como essa correcção deve ser exercida, sem “ser animada por espírito de condenação ou censura” mas sempre “movida pelo amor e misericórdia que brotam duma verdadeira solicitude pelo bem do irmão”.
Quando entra no tema do dom da reciprocidade, o Papa apela a que não busquemos o próprio interesse, mas antes “o do maior número”. Este conselho reveste-se duma actualidade impressionante sobretudo se tivermos em mente as dificuldades sociais e os sacrifícios que têm vindo a ser pedidos um pouco por todo o mundo. Podemos também englobar nesta linha de pensamento o projecto “Bem Comum” lançado por um grupo significativo de empresas portuguesas.
No final da mensagem, ao dissertar acerca do caminhar juntos na santidade, Bento XVI relembra a vocação universal à santidade, já que “todos recebemos riquezas espirituais ou materiais úteis para a realização do plano divino”. Apela à Igreja para que se desenvolva no sentido de alcançar a plena maturidade em Cristo, dando renovado testemunho de amor neste mundo que tanto dele necessita.


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