Nota Pastoral Sobre a Aula de Religião e Moral - 1980

1. Está prestes a terminar mais um ano lectivo. É tempo de fazer a avaliação do trabalho realizado nas nossas escolas e tomar consciência do que ele significa no crescimento integral das crian­ças e jovens estudantes. Dada a especial importância das escolas entre todos os meios de educação (Cf. Concílio Vaticano I, Gravissimum Educationis , n. 5), a avaliação do aproveita­mento escolar não poderá fazer-se apenas em termos de aquisição de conhecimentos; terá de referir-se, muito concretamente, aos objectivos gerais duma educação integral e aos direitos que, neste domínio, assistem aos próprios educandos e suas famílias. .

Como bem sublinha o Concílio Vaticano II, a educação visa o «desenvolvimento harmónico das qualidades físicas, morais e intelectuais» das crianças e dos jovens; visa a «aquisição gradual dum sentido mais perfeito da responsabilidade na própria vida» e na vida social (Ibidem, n. 1). O mesmo Concílio afirma o direito que os alunos têm de ser ajudados a «apreciar os valores morais e a abraçá-los pessoalmente»; direito também a que «seja iluminado pela fé o conhecimento que na escola vão adquirindo, gradualmente a respeito do mundo, da vida e do homem» (Ibidem, n. 1 e 8).  Neste sentido, louva as sociedades que, tendo em conta o pluralismo actual e atendendo à justa liberdade religiosa, ajudam as famílias para que a educação dos filhos possa fazer-se em todas as escolas, segundo os princípios morais e religiosos das mesmas famílias (Ibidem, n. 7).

Aula de Religião e Moral nas Escolas - Porquê e para quê?

2. Em Portugal, a maioria da população declara-se católica. A Concordata entre Portugal e a Santa Sé teve em conta esta realidade ao assegurar a existência de aulas de Religião e Moral Católicas, nas escolas primárias, preparatórias e secundárias e ainda nas escolas do magistério primário e infantil.

Deste modo, a Igreja está presente nas escolas, não apenas pelo testemunho de vida dos professores e alunos cristãos, mas através de um tempo específico de reflexão e revelação-desco­berta dos valores humanos. morais e religiosos. Uma aula que gostaríamos fosse considerada mais como exigência da dimensão moral e religiosa de todo o homem do que como imperativo das normas concordatárias. A escola. com efeito. terá de definir-se cada vez mais como lugar destinado à formação integral do homem e não à simples instrução ou aquisição de hábitos intelectuais; como lugar onde se respeitam. educam e desenvolvem todas as dimensões da personalidade dos alunos e. entre estas. a dimensão religiosa.

A acção educadora da Igreja nas escolas tem a sua originali­dade própria; não substitui nem se confunde com a catequese, que tem lugar nas famílias e nas outras comunidades eclesiais. Antes a completa naquilo que tem de específico.

A proposição 28 do Sínodo dos Bispos de 1977. sobre a Ca­tequese no nosso tempo. referindo-se à educação cristã que se faz nas escolas. aponta como sua «originalidade» o facto de ela constituir «o estudo do progresso da cultura à luz do Evangelho, para assim estimular uma visão do mundo verdadeiramente cristã». Dentro desta perspectiva. as aulas de Religião e Moral não visam directamente uma catequese sistemática, como poderá e deverá fazer-se nas comunidades eclesiais. Elas pretendem. sobretudo. iluminar com a mensagem cristã as descobertas que, através das diversas disciplinas, os alunos vão fazendo sobre o homem. a vida .e o mundo; e deste modo proporcionar uma síntese entre a fé e a cultura, entre a fé e a vida (Cf. S. C. para a Educação Católica, A Escola Católica. n.os 38 e 44).

Como toda a educação cristã. também as aulas de Religião e Moral hão-de contribuir para um maior apreço dos valores morais e despertar para uma maior consciência e empenhamento na promoção duma sociedade mais harmónica e mais fraterna (Cf. Conferência Episcopal Portuguesa, Orientações Pastorais sobre a Escola Católica , n.º 10), em solidariedade com todos os homens.

Esforço de renovação

3. Para que a aula de Religião e Moral realize, efectivamente, os seus objectivos, é preciso que os pais e jovens cristãos se interessem e saibam aproveitá-la. É para isso, também, que a Igreja, através dos serviços nacionais e diocesanos competentes, procura elaborar os programas, preparar os textos, propor os pro­fessores e apoiá-los no desempenho da sua missão.

Tem sido grande o esforço nesse sentido, nos últimos anos. Actualmente, encontram-se em revisão os programas do 7.° e 8.° anos de escolaridade, e em preparação os textos para a 2.ª fase do ensino primário. Todos os restantes anos do ensino básico e secundário têm os seus programas e textos já elaborados e em experimentação. Também a preparação e reciclagem dos profes­sores se tem vindo a fazer, de acordo com as possibilidades de cada Diocese e os recursos do Secretariado Nacional. Constitui, no entanto, ponto que vai continuar a merecer especial atenção e cuidado.

Um direito e um dever

4. A aula de Religião e Moral nas escolas oficiais é facultativa. Dado o pluralismo de convicções existente nessas escolas, a não-obrigatoriedade das aulas respeita o direito dos alunos e pais que não as aceitam ao mesmo tempo que garante a efecti­vação do direito dos outros a receberem a formação religiosa que desejam. A existência das. aulas de Religião e Moral nas escolas oficiais corresponde a um direito pessoal dos alunos, protegido pelos pais, enquanto menores.

Trata-se de um direito e de uma responsabilidade. Com efeito, o aproveitamento deste meio de formação é exigência da própria fé na sua relação com a cultura e sinal de coerência com as pró­prias convicções, mesmo quando estas se encontram na fase crítica da sua consolidação. Assim, se, por um lado, é compreensível que pais não-católicos peçam isenção desta aula para os seus filhos, muito poucas razões válidas se poderão encontrar, por outro lado, para que pais católicos procedam do mesmo modo. Sendo o ca­rácter facultativo da aula de ordem mais funda do que a da simples conveniência, facilmente se vê que a isenção não possa justificar­-se arbitrariamente, como muitas vezes acontece, quando as cir­cunstâncias de realização da aula e os horários, em especial, não são favoráveis.

Responsabilidade dos pais e jovens cristãos

5. A inscrição na aula de Religião e Moral realiza-se nas escolas dos diversos graus de ensino, no acto da matrícula. Aos pais compete decidir, em relação aos filhos de idade inferior a 18 anos; a partir desta idade, compete aos próprios jovens assumir pessoalmente a responsabilidade da inscrição. Em qualquer dos casos, porém, aconselha-se um diálogo prévio pais-filhos, a fim de que a opção tomada seja, de facto e quanto possível, assumida conjuntamente. No boletim de matrícula há-de constar de forma bem explícita o «sim» ou o «não» da escolha feita.

Aos pais e jovens cristãos gostaríamos de lembrar esta sua responsabilidade. Não basta que o homem cresça em conheci­mentos científicos e cultura profana; importa que a cultura reli­giosa e o esclarecimento da fé acompanhem todo o desenvolvi­mento intelectual e cultural. Só deste modo poderão evitar-se os desequilíbrios tantas vezes verificados, os desníveis entre os co­nhecimentos religiosos e as restantes matérias, e certas crises de fé que melhor se hão-de entender como crises resultantes da falta de conhecimentos básicos adequados.

Ao fazerem a sua opção, não se deixem os jovens conduzir pelo mais fácil. Pensem na necessidade de darem à sua fé uma dimensão adulta, de encontrarem ajuda nas crises próprias da sua idade, de darem testemunho cristão de amor à verdade e de es­forço no aprofundamento da mensagem evangélica, no próprio estabelecimento de ensino.

As próximas matrículas - Apelo à comunidade cristã

6. Ao aproximar-se o período das matrículas nas escolas pri­márias, preparatórias e secundárias, queremos com esta nossa palavra:

·         pedir aos párocos e demais sacerdotes que as recordem também aos fiéis das suas comunidades, sempre que seja oportuno e, muito concretamente, em todas as Eucaristias do próximo domingo, dia 15 de Junho;

·         e «encorajar os Professores de Religião e Moral, a que, pela oração, aprofundem a sua vida de fé, a que se espe­cializem e actualizem, ponham em comum as suas difi­culdades e experimentem formas cada vez mais adaptadas de comunicar a mensagem de Jesus Cristo aos mais novos» (Ibidem, n.º 12).

Lisboa, 2 de Junho de 1980.



Newsletter Educris

Receba as nossas novidades