Igreja: Francisco desafia bispos europeus a ser «artesãos e arquitetos da paz e da unidade»

Aos participantes da Assembleia da Comissão dos Episcopados da Comunidade Europeia (COMECE), Papa lembrou “sonhos dos pais do projeto Europa” e pediu “olhos no horizonte” longe das “prisões das burocracias” para contribuir para a "construção da paz"

 

Queridos irmãos e irmãs, bom dia, sejam bem-vindos!

Agradeço ao novo Presidente e desejo-lhe as maiores felicidades para o seu serviço. Para o Cardeal Hollerich vai a minha sincera gratidão. Ele nunca pára, nunca pára! E saúdo-vos a todos agradecendo pelo vosso trabalho, também exigente e apaixonante, se não ficardes presos à burocracia e mantiverdes os olhos alto no horizonte, nos valores inspiradores do projeto-Europa. Por isso, hoje gostaria de me deter brevemente convosco sobre dois focos, que correspondem aos dois grandes "sonhos" dos pais fundadores da Europa: o sonho da unidade e o sonho da paz.

A unidade. Sobre este primeiro ponto é fundamental precisar que a Europa não pode ser uma unidade uniforme, homóloga, mas pelo contrário deve ser uma unidade que respeite e valorize as singularidades, as peculiaridades dos povos e culturas que a compõem. Pensemos nos pais fundadores: eles pertenciam a diferentes países e culturas: De Gasperi e Spinelli da Itália, Monnet e Schuman da França, Adenauer da Alemanha, Spaak da Bélgica, Beck de Luxemburgo, para recordar os principais. A riqueza da Europa reside na convergência de diferentes fontes de pensamento e experiências históricas. Como um rio, vive dos seus afluentes. Se os afluentes estiverem enfraquecidos ou bloqueados, todo o rio é afetado e perde força. A originalidade dos afluentes. Devemos respeitar isso: a originalidade de cada país.

Esta é a primeira ideia para a qual chamo a vossa atenção: a Europa tem futuro se for verdadeiramente uma união e não uma redução de países com as respetivas características. O desafio é precisamente este: a unidade na diversidade. E é possível se houver uma forte inspiração; caso contrário, prevalece o aparato, prevalece o paradigma tecnocrático, que, no entanto, não é fecundo porque não emociona as pessoas, não atrai as novas gerações, não envolve as forças vivas da sociedade na construção de um projeto comum.

Perguntamo-nos: qual é o papel da inspiração cristã neste desafio? Não há dúvida de que na fase inicial desempenhou um papel fundamental, porque estava no coração e na mente dos homens e mulheres que iniciaram esta ‘empreitada’. Hoje muita coisa certamente mudou, mas é sempre verdade que são os homens e as mulheres que fazem a diferença. Portanto, a primeira tarefa da Igreja neste campo é formar pessoas que, lendo os sinais dos tempos, saibam interpretar o projeto europeu na história de hoje.

E aqui chegamos ao segundo ponto: a paz. A história de hoje precisa de homens e mulheres animados pelo sonho de uma Europa unida ao serviço da paz. Após a Segunda Guerra Mundial, a Europa experimentou o mais longo período de paz da sua história. No entanto, houve várias guerras no mundo. Nas últimas décadas algumas guerras arrastaram-se durante anos, até hoje, tanto que já podemos falar de uma terceira guerra mundial. A guerra na Ucrânia está próxima e abalou a paz europeia. As nações vizinhas fizeram o possível para acolher os refugiados; todos os povos europeus participam do compromisso de solidariedade para com o povo ucraniano. A esta resposta em coro, ao nível da caridade, deve corresponder – mas claramente que não é fácil nem evidente – um compromisso coeso pela paz.

Este desafio é muito complexo, porque os países da União Europeia estão envolvidos em múltiplas alianças, interesses, estratégias, uma série de forças que é difícil reunir num único projeto. No entanto, um princípio deve ser compartilhado por todos com clareza e determinação: a guerra não pode e não deve mais ser considerada como uma solução para os conflitos (cf. Enc. Fratelli tutti, 258). Se os países da Europa hoje não compartilham desse princípio ético-político, isso significa que eles se afastaram do sonho original. Se, pelo contrário, o partilham, devem comprometer-se a implementá-lo, com todo o esforço e complexidade que a situação histórica exige. Porque "a guerra é um fracasso da política e da humanidade" (ibid., 261). Temos de repetir isto aos políticos.

Também neste desafio da paz, a COMECE pode e deve dar o seu contributo valorativo e profissional. Sois por natureza uma "ponte" entre as Igrejas na Europa e as instituições da União. Vós sois por missão construtores de relacionamentos, encontros e diálogos. E assim já estais trabalhando pela paz. Mas isto não é suficiente. Também é preciso profecia, é preciso um olhar profundo e ao longe, é preciso criatividade para promover a causa da paz. Neste canteiro de obras são necessários arquitetos e artesãos; mas eu diria que o verdadeiro construtor da paz deve ser arquiteto e artesão: assim é o verdadeiro construtor da paz. Desejo-o também para cada um de vós, sabendo muito bem que cada um tem os seus carismas pessoais que competem com os dos outros no trabalho comum.

Caríssimos, expresso novamente a minha gratidão e garanto que rezo por vós e pelo vosso serviço. Hoje refleti sobre estes dois focos particularmente urgentes, mas encorajo-vos a continuar como sempre o vosso trabalho na frente eclesial. Nossa Senhora vos guarde e vos ampare. A todos abençoo de coração e peço-vos que rezem por mim. Obrigado.

Tradução Educris a partir do original em italiano

Imagem: COMECE

Educris|23.03.2023



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