Ângelus: «Deus está sempre para lá dos nossos esquemas», afirma o Papa

No terceiro domingo do Advento, e antes da recitação da oração mariana do Ângelus, o Papa Francisco exortou os fiéis a questionarem as suas "ideias e esquemas sobre Deus", de modo a poder dar espaço "ao Deus da misericórdia" que sempre "nos surpreende e vai para além dos nossos esquemas e certezas"

Leia, na íntegra, a reflexão do Santo Padre

Queridos irmãos e irmãs, feliz domingo!

O Evangelho deste terceiro domingo do Advento fala-nos de João Baptista que, na prisão, envia os seus discípulos a perguntar a Jesus: «És tu aquele que há-de vir ou devemos esperar outro?» (Mt 11,3). Ao ouvir sobre as obras de Jesus, João é assaltado pela dúvida de se ele realmente é o Messias ou não. De facto, havia pensado num Messias severo que, quando chegasse, faria justiça punindo com força os pecadores. Jesus, ao contrário, tem palavras e gestos de compaixão para com todos, no centro da sua ação está a misericórdia que perdoa, onde «os cegos vejam e os coxos andam, os leprosos sejam purificados e os surdos ouçam, os mortos ressuscitam, e a boa nova seja anunciada aos pobres» (v. 5). É bom nos determos nesta crise de João Batista, porque também ela nos pode dizer algo importante.

O texto enfatiza que João está na prisão, e isto, além do lugar físico, faz-nos pensar na situação interna que ele vive: na prisão há escuridão, falta a possibilidade de ver claro e ver além. De facto, o Batista não mais consegue reconhecer Jesus como o Messias esperado. Ele é assaltado pela dúvida e envia os discípulos para que verifiquem: “ide a ver se ele é o Messias ou não". Surpreende-nos que isto aconteça precisamente a João, que batizou Jesus no Jordão e o indicou aos seus discípulos como o Cordeiro de Deus (cf. Jo 1, 29). Mas isto significa que mesmo o maior crente passa pelo túnel da dúvida. E isto não é mau, aliás, às vezes é essencial para o crescimento espiritual: ajuda-nos a entender que Deus é sempre maior do que imaginamos; as obras que realiza são surpreendentes em relação aos nossos cálculos; a sua ação é diferente, e supera sempre as nossas necessidades e expectativas; e por isso nunca devemos deixar de procurá-lo e converter-nos à sua verdadeira face. Um grande teólogo disse que Deus «deve ser redescoberto em etapas... às vezes acreditando que o perdes» (H. de Lubac, Sulle vie di Dio, Milão 2008, 25). Assim faz o Batista: na dúvida, volta a procurá-lo, questiona-o, “discute” com ele e finalmente descobre-o. João, definido por Jesus como o maior entre os nascidos de mulher (cf. Mt 11,11), ensina-nos a não fechar Deus nos nossos esquemas. Este é sempre o perigo, a tentação: fazermos um Deus à nossa medida, um Deus para usar. E Deus é outra coisa.

Irmãos e irmãs, também nós podemos, às vezes, encontrar-nos na sua situação, numa prisão interior, incapazes de reconhecer a novidade do Senhor, que talvez nos mantenhamos presos na presunção de já saber tudo sobre Ele. Queridos irmãos e irmãs, nunca se sabe tudo sobre Deus, nunca! Talvez tenhamos em mente um Deus poderoso que faz o que quer, em vez do Deus da mansidão humilde, o Deus da misericórdia e do amor, que sempre intervém respeitando a nossa liberdade e as nossas escolhas. Talvez também nos ocorra dizer: "És tu mesmo, tão humilde, o Deus que vem salvar-nos?" E algo semelhante também nos pode acontecer com os irmãos: temos as nossas ideias, os nossos preconceitos e colocamos rótulos rígidos nos outros – especialmente naqueles que sentimos serem diferentes de nós. O Advento, então, é um tempo de inversão de perspetiva, onde nos deixamos maravilhar pela grandeza da misericórdia de Deus. O espanto: Deus surpreende sempre. (Vimos recentemente, no programa "A Sua Imagem", e estavam a falar de espanto). Deus é sempre Aquele que desperta em nós a admiração. Um tempo —Advento— em que, preparando o presépio do Menino Jesus, reaprendemos quem é o nosso Senhor; um tempo para sair de certos esquemas, de certos preconceitos para com Deus e os irmãos. O Advento é um tempo em que, em vez de pensar em dons para nós mesmos, podemos doar palavras e gestos de consolação a quem está ferido, como Jesus fez com os cegos, surdos e coxos.

Que a Virgem nos pegue pela mão, como mãe, nos pegue pela mão nestes dias de preparação para o Natal e nos ajude a reconhecer na pequenez do Menino a grandeza de Deus que vem.

Imagem: Vatican MEDIA

Tradução Educris a partir do original em italiano|11.12.2022



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