Discurso do Papa Francisco no «Encontro de Oração pela Paz»

Francisco encerrou, com um discurso de apelo à paz, o encontro internacional promovido pela Comunidade de Santo Egídio, sob o tema «O grito da paz. Religiões e Cultura em diálogo». Iniciativa teve lugar em Roma de 23 a 25 de outubro

Distintos Líderes de Igrejas Cristãs e Religiões Mundiais,

irmãos e irmãs,

Autoridades ilustres!

Agradeço a cada um de vós que participa deste encontro de oração pela paz. Expresso especial gratidão aos líderes cristãos e líderes de outras religiões, animados pelo espírito de fraternidade que inspirou a primeira convocação histórica desejada por São João Paulo II em Assis, há trinta e seis anos.

Este ano a nossa oração tornou-se um "grito", porque hoje a paz está gravemente violada, ferida, pisada: e isto na Europa, isto é, no continente que no século passado viveu as tragédias das duas guerras mundiais - e nós estamos na terceira. Infelizmente, desde então, as guerras nunca pararam de sangrar e empobrecer a terra, mas o momento que vivemos é particularmente dramático. Por isso elevamos a nossa oração a Deus, escuta sempre o grito angustiado dos seus filhos. Escuta-nos, Senhor!

A paz está no coração das Religiões, nas suas Escrituras e na sua mensagem. No silêncio da oração, esta noite, ouvimos o clamor pela paz: a paz sufocada em tantas regiões do mundo, humilhada por demasiada violência, negada também às crianças e aos idosos, que não são poupados da terrível dureza da guerra. O clamor pela paz é muitas vezes silenciado não apenas pela retórica da guerra, mas também pela indiferença. É silenciado pelo ódio que cresce enquanto lutam entre si.

Mas a invocação da paz não pode ser suprimida: nasce do coração das mães, está escrita nos rostos dos refugiados, das famílias em fuga, dos feridos ou dos moribundos. E este grito silencioso sobe ao céu. Não conhece fórmulas mágicas para sair dos conflitos, mas tem o sacrossanto direito de pedir a paz em nome dos sofrimentos sofridos, e merece ser ouvido. Merece que todos, começando pelos governantes, se inclinem para ouvir com seriedade e respeito. O clamor pela paz exprime a dor e o horror da guerra, mãe de toda a pobreza.

“Toda a guerra deixa o mundo pior do que o encontrou. A guerra é um fracasso da política e da humanidade, uma rendição vergonhosa, uma derrota diante das forças do mal” (Enc. Fratelli tutti, 261). São convicções que brotam das lições mais dolorosas do século XX e, infelizmente, também desta parte do século XXI. Hoje, de facto, está em curso o que se temia e o que nunca quisemos tornar a escutar: que o uso de armas atómicas, que copiosamente continuaram a ser produzidas e testadas depois de Hiroshima e Nagasaki, está agora abertamente ameaçado.

Neste cenário sombrio, onde infelizmente os desígnios dos poderosos da terra não dependem das justas aspirações dos povos, o plano de Deus não muda para a nossa salvação, que é "um plano de paz e não de infortúnio" (cf. Jr 29, 11). Aqui a voz dos sem voz é ouvida; aqui se funda a esperança dos pequeninos e dos pobres: em Deus, cujo nome é Paz. A paz é o seu dom e nós a invocamos até Ele. Mas este dom deve ser acolhido e cultivado por nós homens e mulheres, especialmente por nós crentes. Não nos deixemos contaminar pela lógica perversa da guerra; não caiamos na armadilha do ódio ao inimigo. Coloquemos a paz no centro da visão de futuro, como objetivo central da nossa ação pessoal, social e política, em todos os níveis. Desarmemos os conflitos com a arma do diálogo.

Durante uma grave crise internacional, em outubro de 1962, enquanto um confronto militar e uma explosão nuclear pareciam próximos, São João XXIII fez este apelo: “Pedimos a todos os governantes que não permaneçam surdos a este grito de humanidade. Que façam tudo o que estiver ao seu alcance para salvar a paz». «Evitarão assim os horrores de uma guerra no mundo, cujas terríveis consequências não podem ser previstas. […] Promover, encorajar, acolher o diálogo, em todos os níveis e em todos os momentos, é uma regra de sabedoria e prudência que atrai a bênção do céu e da terra” (Rádio Mensagem, 25 de outubro de 1962).

Sessenta anos depois, estas palavras soam com relevância impressionante. Faço-as minhas. Não somos «neutros, mas alinhados pela paz. Por isso, invocamos o ius pacis como direito de todos para resolver conflitos sem violência” (Encontro com estudantes e o mundo académico de Bolonha, 1 de outubro de 2017).

Nos últimos anos, a fraternidade entre as religiões fez um progresso decisivo: "Religiões irmãs que ajudam os povos irmãos a viver em paz" (Encontro de Oração pela Paz, 7 de outubro de 2021). Sentimo-nos, cada vez, mais irmãos uns dos outros! Há um ano, quando nos encontrámos aqui mesmo, diante do Coliseu, lançámos um apelo, hoje ainda mais relevante: «As religiões não podem ser usadas para a guerra. Só a paz é santa e ninguém usa o nome de Deus para abençoar o terror e a violência. Se virdes guerras ao vosso redor, não desistais! Os povos desejam a paz” (ibid.).

E é isto que devemos tentar e continuar a fazer, cada vez melhor, dia a dia. Não nos resignemos à guerra, cultivemos sementes de reconciliação; e hoje elevemos ao Céu o grito de paz, novamente com as palavras de São João XXIII: «Que todos os povos da terra sejam irmãos e irmãs e que a paz tão desejada floresça neles e reine sempre» Enc. Pacem in terris, 91). Assim seja, com a graça de Deus e a boa vontade dos homens e mulheres que Ele ama.

Tradução Educris a partir do original em italiano

Imagem: @Vatican Media

Educris|25.10.2022



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