D. Daniel Batalha Henriques presidiu, hoje, à eucaristia de encerramento da Semana Nacional da Educação Cristã. Na sua homilia o vogal da Comissão Episcopal da Educação Cristã agradeceu aos educadores cristãos o seu papel na transmissão da fé, em contexto catequético, e na formação para os valores do evangelho para uma sociedade mais justa e fraterna.
Semana Nacional da Educação Cristã – 18 a 25 outubro 2020Eucaristia de encerramento - 25 de outubro, Paróquia de S. Pedro, Peniche
I – Dois mandamentos que são um só, como as faces de uma mesma moeda
Qual é o maior mandamento da Lei de Deus? Amar a Deus e ao Próximo!
Quem não conhece esta síntese admirável de toda a “Lei e dos Profetas”, feita pelo próprio Senhor Jesus, diante da pergunta traiçoeira do Doutor da Lei? Aprendemo-la desde pequeninos, em casa, com os nossos pais, nos bancos da catequese e nas homilias: não é possível separar o Amor a Deus e o Amor aos irmãos sem estarmos a negar a nossa própria identidade cristã.
Para este homem, perito nas Escrituras, dos livros da Lei podiam retirar-se centenas de Leis e preceitos, um emaranhado praticamente impossível de cumprir e que, acima de tudo, não deixava vislumbrar o essencial. A resposta de Jesus é muito clara, sem dar lugar a qualquer dúvida. E Jesus toma-a de dois versículos da Lei, retirados do Livro do Deuteronómio e do Levítico: Amar a Deus com todo o coração, com toda a alma e com todo o Espírito e amar o próximo como a si mesmo (Dt 6,5; Lv 19,18). Jesus não apresenta apenas um, mas dois mandamentos. Mas dois mandamentos que não se podem separar, como não se pode separar a cara e a coroa de uma mesma moeda. Reparemos, no entanto, que Jesus não diz que o segundo é “igual”, mas sim “semelhante” ao primeiro. Nas palavras de Jesus, amar a Deus é o primeiro e o maior mandamento, mas amar o próximo é um mandamento semelhante a este e, acima de tudo, inseparável deste. Um purifica e faz crescer o outro. Diminuir um é atrofiar o outro. Como afirma o Papa Francisco, “o Amor é a medida da Fé e a Fé é a alma do Amor” (Angelus, 26 outubro 2014). Não deixemos separar em nós o que Jesus uniu na sua pessoa: o amor ao Pai e aos Irmãos.
Podemos perguntar: será mais fácil amar a Deus ou o nosso próximo? Conhecendo nós a dificuldade que é amar o outro de todo o coração, também nas suas fragilidades e pecados, poderíamos responder prontamente que muito mais fácil é amar a Deus, que é suma perfeição e nos ama com amor infinito e está sempre pronto a perdoar! No entanto, a Palavra de Deus fala de um amor que vai muito além de vagos sentimentos e emoções que nos fazem estremecer. É um amor que convoca a nossa vontade, o nosso coração, a nossa alma, as nossas forças. Este amor é sempre resposta a um amor maior que o precede, o amor de Deus por nós: “amamos porque Deus nos amou primeiro”, escreve São João na sua primeira epístola (I Jo 4,19). No entanto, é uma amor que convoca a decisão livre da minha vontade: “decido amar-te, meu Senhor!” Mais, é um amor que não pede menos do que a totalidade do nosso ser e do nosso agir, um dar-se por inteiro, a nós que nos damos de forma parcelar, cautelosa e egoísta.
Semelhante a este, diz Jesus, é o mandamento de “amar ao próximo como a si mesmo”. É assim que Jesus responde aos escribas, fariseus, doutores da Lei ou aos judeus em geral: citando o Livro do Levítico. No entanto aos seus discípulos, em particular, o Senhor vai mais longe: “amai-vos como Eu vos amei” (Jo 15,12). E acrescenta: “ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos amigos” (Jo 15,13). Manifesta esse amor, feito de entrega e serviço, lavando os pés aos discípulos como gesto que antecipa a sua entrega na Cruz. “Vistes o que vos fiz? Assim deveis fazer vós também” (Jo 13, 12-15). Ele bem sabe que não basta o mandamento “amar o próximo como a nós mesmo”, nós que nos amamos a nós próprios de formas tão erradas. Santo António de Lisboa dizia num dos seus sermões: “ama-te da mesma maneira que te amou Aquele que se entregou por ti”, mas não é assim que habitualmente nos amamos. Como o amor a Deus, também o amor ao próximo é mais do que bons sentimentos: é um amor em ação, abnegado de si, debruçado sobre as feridas do irmão. No evangelho de Lucas, diante desta mesma pergunta e da resposta de Jesus, para justificar a pergunta, o seu interlocutor interroga-o: “e quem é o meu próximo?” (Lc 10,29) Então Jesus conta a parábola do Bom Samaritano e interpela-o: “qual destes três parece ter sido o próximo daquele que caiu nas mãos dos ladrões?” Então vai e faz o mesmo!” (Lc 10,36-38). Amar assim, ao jeito do Bom Samaritano, é amar ao jeito de Jesus, pois este Bom Samaritano é Ele mesmo, debruçado sobre a nossa fragilidade e cuidando das nossas feridas, levando-nos aos ombros como na parábola da ovelha perdida.
II – No encerramento da Semana Nacional da Educação Cristã
Encerra-se neste domingo a Semana Nacional da Educação Cristã. O Senhor oferece-nos a oportunidade de repensar e reforçar o nosso compromisso diante da tarefa fundamental de educar as novas gerações no “agora de Deus”, com o coração, a mente e as mãos enraizadas na Esperança de um futuro mais humanizado.
Gostaria de agradecer o trabalho que se recria e desenvolve nas paróquias, nas escolas e nos colégios católicos por todos os educadores cristãos. Educar é sempre um enorme desafio. Propor valores altos e perenes, enraizados no Evangelho, é tarefa que a muitos envolve e só com e nas comunidades pode ser realizada. Por isso, apelo aos párocos, aos catequistas, aos professores de Educação Moral e Religiosa Católica, aos professores e outros educadores das escolas católicas, para que continuem a fazer do mandato de Jesus “ide e ensinai” a sua motivação, sempre animados pelo Espírito Santo, numa dinâmica de amor e de serviço.
Dirijo às famílias uma palavra de especial apreço. A Nota Pastoral da Comissão Episcopal da Educação Cristã e Doutrina da Fé para esta Semana tem como tema “Fortalecer e apoiar a Família, Igreja Doméstica”. Com efeito, refere esta Nota Pastoral que os constrangimentos sentidos devido à atual Pandemia, vieram “evidenciar a importância fundamental da família na transmissão da vida e dos valores humanos e cristãos, assim como da sua função insubstituível na construção de laços, na educação dos afetos e no acolhimento mútuo. Ela foi o refúgio e o apoio das pessoas ameaçadas por este flagelo.” E conclui observando que “as experiências vividas nestes últimos tempos despertaram inúmeras famílias para a dimensão espiritual da vida e motivou para um maior envolvimento na educação religiosa dos filhos.”
Por isso, apelo a que, conscientes da beleza e do tesouro que em vós reside e a vós é confiado, vos esforceis por contribuir para que os vossos filhos e netos sejam agentes transformadores deste mundo que habitamos. Que a educação cristã seja um bem no qual acreditais e que desejais fomentar, razões para a requererdes, seja na escola, através da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica, seja na Paróquia, através da catequese ou dos grupos juvenis. Não a abandoneis à arbitrariedade de critérios alheios.
Conscientes de que a família é “Igreja Doméstica”, observa ainda a Nota Pastoral que “dioceses, paróquias e escolas procuraram sensibilizar e apoiar as famílias a viver a liturgia e a oração quotidianas e a intensificar a sua participação na educação formal dos filhos”, nas circunstâncias vividas nestes últimos tempos.
Na vossa tarefa educativa, contai, pais e avós, com a colaboração dos diferentes educadores cristãos, nas escolas e nas paróquias, e tornai-vos participantes ativos nestes contextos educativos. Partilhai a vossa experiência de vida, de fé e de amor, para que, todos juntos, como Igreja, aprendamos a ser “hospital de campanha”, nesta expressão tão forte do Papa Francisco, acolhendo a Cristo e aos irmãos na vida de todos os dias.
D. Daniel Batalha Henriques Bispo auxiliar de Lisboa Vogal da CEECDF
25.10.2020
Homilia de D.Daniel Batalha Henriques no encerramento da Semana Nacional da Educação Cristã 2020