Diário de Etty Hillesum, a rapariga de Amesterdão

Estamos perante um diário que só foi revelado ao mundo na década de oitenta, do século XX. Estas trezentas e quarenta e duas páginas contam-nos a história de uma judia, holandesa, e da sua brutal experiência existencial.
Etty Hillesum é a mais velha de três filhos de um casal judeu: Louis Hillesum, professor de línguas clássicas, e Rebecca Hillesum-Bernstein, emigrante russa.

Foi a nove de março de 1942, que Esther (Etty) Hillesum começou a escrever o seu diário: com letra fininha, em papel quadriculado. Tinha vinte e sete anos de idade.

Ao longo do diário assistimos a um processo de mudança (metanoia) que nos são revelados em três encontros: o primeiro refere-se a uma pessoa: Julius Spier. Julius Spier é um judeu de Frankfurt, sendo a psicoquirologia (psicanalista, quiromante e xamã) a sua principal ocupação. Como terapêutica S. (como é tratado no diário) insta Etty a escrever as suas memórias num diário. Spier iniciou Etty na prática da oração, na leitura do Antigo e Novo Testamento, de Santo Agostinho...

O Segundo encontro tem o nome de um lugar: alista-se como voluntária no Campo de Concentração de Westerbork. Etty afirma no seu diário: “apaixonei-me tanto por esse Westerbork e tenho saudades de lá. Estes meses [de agosto de 1942 até setembro de 1943] entre arame farpado foram os meus meses mais intensos e ricos.”

O terceiro é o encontro com o Inominável. Etty mostra que sempre teve uma forte confiança em Deus: “quando ontem, às duas da manhã, finalmente cheguei lá acima ao quarto da Dicky e me ajoelhei quase nua, no meio do quarto, totalmente deprimida, eu disse de repente: ‘Hoje, vendo bem, vivi coisas grandiosas e esta noite também, meu Deus, agradeço-te por eu suportar tudo e por haver poucas coisas que não ponhas no meu caminho’.”

Estes

três encontros tornam Deus cada vez mais presente na sua vida. Alguém que nunca tinha ouvido falar de Deus, no meio da tortura absoluta afirma: “vou ajudar-te, Deus, a não me abandonares.”

Em setembro de 1943, Etty foi deportada para Auschwitz, vindo a falecer em novembro desse ano.

Escreve o padre José Tolentino Mendonça no prefácio da edição portuguesa deste diário: “É impossível não aproximar o percurso que faz Ettye Hillesum daquele vivido também por Simone Weil. São contemporâneas, ambas judias, debatendo-se por salvaguardar o sol interior num século de horas sombrias, ambas escritoras, ambas consumando até ao fim (ou mais para lá do fim) um destino de aniquilamento como se de uma incrível aventura espiritual se tratasse. A própria morte as aproxima, ocorrida no mesmo ano: 1943. Simone morre num hospício inglês, como se expirasse entre as vítimas, na frente mais exposta de um combate, e Etty num campo de concentração, para o qual partiu cantando.

Também em 1942, em Amesterdão outra rapariga, escreve um diário: Anne Frank.

Dário (1941-1943)
Autor: Etty Hillesum
Editora: Assírio & Alvim
Páginas: 342
Ano: 2008
ISBN: 978-972-37-1274-2


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