Audiência-geral:«A Misericórdia é o Coração de Deus»

Na audiência-geral desta quarta-feira o Papa refletiu sobre a "Misericórdia". Uma tematica que sentiu "como minha desde que fui nomeado bispo de Roma". Para Francisco a "misericórdia é o centro da fé e vida cristãs".

Leia, na íntegra e em português, a catequese do Papa Francisco

 

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Debruçamos-mos hoje sobre a quinta bem-aventurança, que diz: «Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia» (Mt 5,7[1]). Nesta bem-aventurança há uma particularidade: é a única em que coincidem a causa e o fruto da felicidade, a misericórdia. Aqueles que exercitam a misericórdia alcançarão misericórdia, serão "misericordiosos".

Este tema, da reciprocidade do perdão, não está presente apenas nesta bem-aventurança, mas é recorrente no Evangelho. E como poderia ser de outra maneira? A misericórdia é o próprio coração de Deus! Jesus diz: «Não julgue e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados: perdoais e sereis perdoados» (Lc 6,37). Sempre a mesma reciprocidade. E a Carta de Tiago afirma que «a misericórdia triunfa do juízo» (2:13).

Mas é sobretudo no Pai Nosso que rezamos: « Perdoa-nos as nossas ofensas, como também nós perdoamos a quem nos tem ofendido» (Mt 6,12); e este pedido é a única relacionada com o final: «Pois, se perdoardes aos homens as suas transgressões, também o vosso Pai celeste vos perdoará; mas se não perdoardes aos homens, também o vosso Pai não perdoará as vossas transgressões». (Mt 6, 14-15; cf. Catecismo da Igreja Católica, 2838).

Há duas coisas que não podem ser separadas: o perdão que se dá e o perdão que se recebe. Mas existem tantas pessoas em dificuldades, não conseguem perdoar. Tantas vezes o mal recebido é tão grande que ser capaz de perdoar lembra ao escalar de uma montanha muito alta: um esforço enorme; e pensa-se: não se pode, isto não se pode. Este facto, da reciprocidade da misericórdia indica que precisamos alterar a perspetiva. Sozinhos não podemos, é preciso a graça de Deus, e devemos pedi-la. De facto, se na quinta bem-aventurança existe a promessa de encontrar a misericórdia e, no Pai Nosso, pedimos a remissão dos pecados, isto significa que somos essencialmente devedores e precisamos de buscar a misericórdia!

Estamos todos em dívida. Todos. A Deus, que é tão generoso, e aos irmãos. Cada um de nós sabe que não é o pai ou a mãe que deveria ser, o noivo ou a noiva, o irmão ou a irmã que deveria ser. Estamos todos "em déficit" na vida. E precisamos de misericórdia. Sabemos que também fizemos o mal, falta sem algo de bem que deveríamos ter feito.

Mas precisamente esta nossa pobreza torna-se a força para perdoar! Estamos em dívida e, se, como ouvimos no início, seremos medidos pela medida com a qual medimos os outros (cf. Lc 6,38), então devemos ampliar a medida e perdoar as culpas, perdoar. Todos se devem lembrar de que precisam perdoar, precisam de perdão, precisam de paciência; este é o segredo da misericórdia: perdoando, é-se perdoado. Por isso Deus precede-nos e perdoa primeiro (cf. Rm 5, 8). Ao receber o seu perdão, nós, por sua vez, tornamo-nos capazes de perdoar. Assim, a própria miséria e a falta de justiça tornam-se ocasião para abrir-se ao reino dos céus, em maior medida, a medida de Deus, que é misericórdia.

De onde vem a nossa misericórdia? Jesus diz-nos: "Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso» (Lc 6,36). Quanto mais se acolhe o amor do Pai, mais se ama (cf. CCC, 2842). A misericórdia não é uma dimensão entre outras, mas é o centro da vida cristã: não há cristianismo sem misericórdia[2]Se todo o nosso cristianismo não nos leva à misericórdia, seguimos o caminho errado, porque a misericórdia é o único objetivo verdadeiro de toda jornada espiritual. É um dos mais belos frutos da caridade (cf. CCC, 1829).

Lembro que este tema foi o que escolhi para o primeiro Ângelus como Papa: misericórdia. E isto permaneceu impresso em mim, como uma mensagem que, como Papa, eu devo transmitir sempre, uma mensagem que deve ser de todos os dias: A misericórdia. Lembro-me daquele dia em que também tive uma atitude "sem pudor" de fazer publicidade a um livro sobre a misericórdia, recém-publicado pelo cardeal Kasper. E naquele dia senti-o de maneira tão forte que esta era a mensagem que devo transmitir, como bispo de Roma: misericórdia, misericórdia, por favor, perdão.

A misericórdia de Deus é a nossa libertação e a nossa felicidade. Vivemos com misericórdia e não podemos ficar sem misericórdia: é o ar para respirar. Somos pobres demais para estabelecer condições, temos necessidade de perdoar, porque precisamos ser perdoados. Obrigado!



[1] Utilizamos a Nova Tradução da Conferência Episcopal Portuguesa

[2] Ver São João Paulo II, Enc. Mergulha na misericordia (30 de novembro de 1980); Bolla Misericordae Vultus (11 de abril de 2015); Lett. Ap. Misericordia et misera (20 de novembro de 2016).

Tradução Educris a partir do original em italiano

19.03.2020



Newsletter Educris

Receba as nossas novidades