Audiência-geral: Gamaliel e os «critérios para o discernimento»

Na oitava catequese sobre o livro dos Atos dos Apóstolos o Papa Francisco recordou a figura de Gamaliel e lembrou os critérios de discernimento que devem fazer parte da vida dos cristãos.

 

Leia, na íntegra, a catequese do Santo Padre

 

Catequese sobre os Atos dos Apóstolos: 8. «não corrais o risco de entrardes em guerra contra Deus». (Atos 5,39). Os critérios de discernimento propostos pelo sábio Gamaliel.

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Continuamos a catequese sobre os Atos dos Apóstolos. Diante da proibição dos judeus de ensinar em nome de Cristo, Pedro e os apóstolos respondem com coragem de quem não podem obedecer àqueles que desejam interromper a viagem do evangelho no mundo.

Os Doze mostram, assim, que eles possuem aquela «obediência da fé» que desejam despertar em todos os homens (Cf, Rm 1,5). Na verdade, a partir do Pentecostes, não são mais homens "sozinhos". Experimentam aquela sinergia especial que os faz descentrar e dizem: «nós e o Espírito Santo» (At 5,32) ou «o Espírito Santo e nós» (At 15,28). Eles sentem que não podem dizer "eu" sozinhos, são homens descentrados de si mesmos. Fortalecidos por esta aliança, os apóstolos não se deixam intimidar por ninguém. Tiveram uma coragem impressionante! Pensávamos que eram cobardes: todos fugiram, fugiram quando Jesus foi preso. Mas, de cobardes tornaram-se tão corajosos.  Porquê? Porque o Espírito Santo estava com eles. O mesmo acontece connosco: se tivermos o Espírito Santo dentro, teremos a coragem de seguir em frente, a coragem de vencer muitas lutas, não por nós mesmos, mas pelo Espírito que está connosco. Eles não recuam na sua marcha como testemunhas intrépidas de Jesus ressuscitado, como os mártires de todos os tempos, incluindo o nosso. Os mártires dão a vida, não escondem que são cristãos. Pensemos, alguns anos atrás - ainda hoje existem muitos -, mas pensemos que, há quatro anos, os cristãos ortodoxos coptas, verdadeiros trabalhadores, na praia da Líbia: foram todos massacrados. Mas a última palavra que eles disseram foi "Jesus, Jesus". Não largaram a fé, porque neles estava o Espírito Santo. Estes são os mártires de hoje! Os apóstolos são "megafones" do Espírito Santo, enviados pelo Ressuscitado, para espalhar prontamente e sem hesitação a Palavra que dá a salvação.

De facto, essa determinação faz tremer o "sistema religioso" judeu, que se sente ameaçado e responde com violência e sentenças de morte. A perseguição aos cristãos é sempre a mesma: as pessoas que não querem o cristianismo sentem-se ameaçadas e, assim, levam a morte aos cristãos. Mas, no meio do Sinédrio, surge a voz diferente de um fariseu que decide conter a reação deles: o seu nome era Gamaliel, um homem prudente, «doutor da lei, estimado por todo o povo». Na sua escola, São Paulo aprendeu a observar "a lei dos pais" (Cfr At 22, 3). Gamaliel toma a palavra e mostra aos seus irmãos como exercitar a arte do discernimento diante de situações que vão além dos padrões habituais.

Ele demonstra, citando alguns personagens que declararam ser o Messias, que todos os projetos humanos podem primeiro receber elogios e depois naufragar, enquanto tudo o que vem de cima e carrega a "assinatura" de Deus está destinado a durar. Projetos humanos falham sempre; eles têm um tempo, como nós. Pensemos em tantos projetos políticos, e como mudam de um lado para o outro, em todos os países. Pensemos nos grandes impérios, pensemos nas ditaduras do século passado: sentiam ser muito poderosos, pensavam que dominavam o mundo. E todos eles entraram em colapso. Ainda hoje, pensai nos impérios de hoje: entrarão em colapso, se Deus não estiver com eles, porque a força que os homens têm em si mesmos não é duradoura. Somente a força de Deus permanece. Pensemos na história dos cristãos, incluindo a história da Igreja, com tantos pecados, tantos escândalos, tantas coisas más nestes dois milênios. E por que é que não entrou em colapso? Porque Deus está lá. Somos pecadores, e tantas vezes motivo de escândalo. Mas Deus está connosco. E Deus salva-nos primeiro, e depois a eles; mas o Senhor salva sempre.  A força é "Deus connosco". Gamaliel demonstra, citando alguns personagens que haviam falecido como Messias, que todo p projeto humano pode primeiro receber elogios e depois ver-se naufragar. Por isso, conclui Gamaliel, se os discípulos de Jesus de Nazaré acreditavam num impostor, eles estavam destinados a desaparecer no nada; mas se, em vez disso, seguem alguém que vem de Deus, é melhor desistir de combatê-los; e adverte: «não corrais o risco de entrardes em guerra contra Deus». (Atos 5,39). Ensina-nos a fazer este discernimento.

São palavras calmas e perspicazes, que nos permitem ver o acontecimento cristão com uma nova luz e oferecer critérios que "são do Evangelho", porque nos convidam a reconhecer a árvore pelos seus frutos (Cfr. Mt 7,16). Tocam corações e alcançam o efeito desejado: os outros membros do Sinédrio seguem a sua opinião e renunciam às intenções de morte, ou seja, matar os apóstolos.

Peçamos ao Espírito Santo que atue em nós para que, tanto pessoalmente como em comunidade, possamos adquirir o hábito do discernimento. Peçamos a graça de saber ver a unidade da história da salvação através dos sinais da passagem de Deus nos nossos dias e nos rostos daqueles que nos rodeiam, porque aprendemos que o tempo e os rostos humanos são mensageiros do Deus vivo.

Tradução Educris a partir do original em italiano

19.09.2019



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