Ângelus: «Proximidade, compaixão e ternura», o modo de transgressão de Jesus, Papa Francisco

Na varanda do Palácio Apóstólico, no Vaticano, o Papa Francisco voltou a rezar a oração do Ângelus com centenas de fiéis na praça de São Pedro. Na sua reflexão o Papa pediu cristãos capazes de "transgredir a lei" a exemplo de "Jesus com o leproso" e agradeceu a "tantos confessores que acolhem com compaixão os irmãos"

Leia, na íntegra a alocução do Santo Padre

Queridos irmãos e irmãs:

Bom Dia! Que linda é a praça com o sol! É bela!

O Evangelho de hoje (cf. Mc 1,40-45) apresenta-nos o encontro de Jesus com um homem leproso. Os leprosos eram considerados impuros e, segundo a prescrição da Lei, deveriam permanecer fora dos locais habitados. Foram excluídos de todas as relações humanas, sociais e religiosas. No domínio religioso não podiam, por exemplo, entrar na sinagoga ou no Templo. Jesus, por seu lado, deixa que aquele homem se aproxime dele, e comove-se, ao ponto d estender a sua mão e o tocar. Isto era impensável na época. Deste modo, realiza a Boa Nova que anuncia: Deus fez-se próximo da nossa vida, tem compaixão do destino da humanidade ferida e vem derrubar todas as barreiras que nos impedem de viver a nossa relação com Ele, com os outros e com nós mesmos. Ficou perto. Proximidade. Lembrai-vos bem desta palavra: proximidade, compaixão. O evangelho diz que Jesus, quando viu o leproso, «teve compaixão dele». Ternura. Três palavras que indicam o estilo de Deus: proximidade, compaixão, ternura. Neste episódio podemos duas "transgressões" que se encontram: a transgressão do leproso que se aproxima de Jesus e não podia fazê-lo, e Jesus que, movido pela compaixão, se aproxima e toca-o com ternura para o curar, e não poderia fazê-lo.  Ambos são transgressores, são duas transgressões.

A primeira transgressão é a do leproso: apesar das prescrições da Lei, ele sai do isolamento e vai ter com Jesus. A sua doença era considerada um castigo divino, mas em Jesus ele podia ver outra face de Deus: não o Deus que pune, mas o Pai da compaixão e do amor, que nos liberta do pecado e que nunca nos exclui da sua misericórdia. Assim, este homem pode sair do seu isolamento, porque em Jesus encontra Deus que partilha a sua dor. A atitude de Jesus atrai-o, leva-o a sair de si e a confiar-Lhe a sua história de dor.

Permitam-me aqui um pensamento para tantos bons padres, confessores, que têm este comportamento de atrair pessoas - são tantas as pessoas que se sentem nada, sentem-se como que chão por causa dos seus pecados - mas com ternura, com compaixão. Bons são os confessores que não estão com chicote na mão, mas prontos para receber, ouvir e dizer que Deus é bom, que Deus perdoa sempre, que Deus não se cansa de perdoar. A estes misericordiosos confessores, peço-vos, a todos vós hoje reunidos nesta praça, uma salva de palmas aqui na praça. Para todos!

A segunda transgressão é a de Jesus: enquanto a Lei proibia tocar nos leprosos, Ele comove-se, estende a mão e toca-o para o curar. Alguns podem dizer: “Mas ele pecou! Ele fez o que a lei proíbe. Ele é um transgressor”. É verdade, ele é um transgressor. Não se limita a palavras, mas toca-o. E tocar com amor significa estabelecer uma relação, entrar em comunhão, envolver-se na vida do outro a ponto de compartilhar até as suas feridas. Com este gesto, Jesus mostra que Deus, que não é indiferente, não guarda uma "distância segura"; aproxima-se, de facto, aproxima-se com compaixão e toca a nossa vida para a curar com ternura. É o estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura. A transgressão de Deus. Neste sentido Ele é um grande transgressor.

Irmãos e irmãs, ainda hoje no mundo muitos dos nossos irmãos sofrem desta doença, a hanseníase (lepra), ou outras doenças e enfermidades a que, infelizmente, estão associados os preconceitos sociais: "Este é um pecador". Pensai naquele momento em que aquela mulher entrou no banquete e derramou aquele perfume nos pés de Jesus. Os outros diziam: “mas se este fosse um profeta, ele saberia, saberia quem é esta mulher, uma pecadora”. O desprezo. Pelo contrário, Jesus recebe, e mais, agradece o gesto: "os teus pecados são-te perdoados". A ternura de Jesus!”. O preconceito social de afastar as pessoas com as palavras "isto é impuro", "este é pecador", "este é um vigarista". Sim, às vezes é verdade, mas não façamos pré juízos.

Mas pode acontecer a cada um de nós experimentar feridas, fracassos, sofrimentos, um egoísmo que nos afasta de Deus e dos outros, porque o pecado fecha-nos sobre nós mesmos, por vergonha, por humilhação, mas Deus quer abrir o coração. Diante de tudo isto, Jesus anuncia-nos que Deus não é uma ideia ou doutrina abstrata, mas que Deus é Aquele que está "contaminado" com a nossa humanidade ferida e que não tem medo de entrar em contato com as nossas feridas. Mas, pai, o que está ele a dizer? Que deus se contamina? Não digo isso, São Paulo disse: "tornou-se pecado" (2 Cor 5, 21). Aquele que não era pecador, que não podia pecar, tornou-se pecado. Vejamos como Deus se contaminou para se aproximar de nós, para ter compaixão e para fazer compreender a sua ternura. Proximidade, compaixão e ternura.

Para respeitar as regras de boa reputação e dos costumes sociais, muitas vezes silenciamos a dor ou usamos máscaras de modo a escondê-la. Para conciliar os cálculos do nosso egoísmo ou as leis internas dos nossos medos, não nos envolvemos muito com o sofrimento dos outros. Pelo contrário, peçamos ao Senhor a graça de viver estas duas "transgressões", estas duas transgressões do Evangelho de hoje. A do leproso, para que tenhamos a coragem de sair do nosso isolamento e, em vez de ali permanecer e reclamar ou chorar os nossos fracassos, com lamentações, cheguemos a Jesus como estamos. Senhor, eu sou assim. Vamos sentir aquele abraço, aquele abraço de Jesus tão lindo. E depois a transgressão de Jesus, que é um amor que nos faz ir além das convenções, que nos faz superar os preconceitos, o medo de nos misturarmos com a vida do outro. Vamos aprender a ser transgressores como estes dois, como o leproso e como Jesus.

 Que a Virgem Maria nos acompanhe neste caminho, que agora invocamos na oração do Ângelus.

Tradução Educris a partir do original em italiano

14.02.2021



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