Santiago de Compostela: O diário de um professor peregrino

A aventura começou em Mangualde no dia 10 de agosto na companhia de mais quatro bicigrinos. Uma experiência única pelos trilhos magnânimos de um Portugal interior e Galiza. O objetivo era percorrer os caminhos do interior de Portugal que se cruzam com a Rota da Prata. Antes de começar, levantamos a Credencial do Peregrino para podermos comprovar que fizemos esta peregrinação com um sentido cristão e ao mesmo tempo deu-nos acesso aos albergues que oferecem a hospitalidade cristã do caminho que iríamos trilhar. A “Compostela” só é concedida a quem deseja fazer a peregrinação com um sentido cristão, sejam devotos de Santiago, tenham feito uma promessa ou venham à procura de aprofundar a sua fé porque estes trilhos são como um retiro onde estamos muitas vezes sozinhos a pensar, a rezar e a fazer uma introspecção da nossa vida. Quem percorre os caminhos de bicicleta tem realizar no mínimo 200km para poder ter acesso ao diploma de peregrino.

Cinco dias, mais de 600km percorridos. Escrevo para memorizar esta experiência e para mostrar como esta peregrinação me fez bem onde há sacrifício mas, ao mesmo tempo, liberdade e aprofundamento da nossa fé porque acreditamos que conseguimos, sentimo-nos protegidos e, ao mesmo tempo, temos tempo para pensar, meditar e rezar. Esta é a experiência das experiências. Sinto-me renovado, revigorado e com muita energia.

A primeira etapa começou em Mangualde e terminou em Lamego. Uma etapa exigente técnica e fisicamente que passou por Viseu, Castro Daire com término em Lamego, com um total de km superior a uma centena. Esta etapa foi marcada pelas pedras soltas e o acumulado encontrado ao longo do percurso que nos desgastaram.

A segunda etapa levou-nos de Lamego a Chaves com passagem na Régua, nas vinhas do Douro, num vertiginoso sobe e desce, desce e sobe até Vila Real, passando por Vilarinho da Samardã, Vila Pouca de Aguiar e término em Chaves.  O calor, o acumulado que ultrapassou por muitas vezes os 20% de inclinação tornaram esta etapa bastante exigente.

A terceira etapa, a mais extensa, com um total de 130km, levou-nos de Chaves a Cea, passando por Ourense. Nesta terceira etapa, entramos na rota da prata, um dos muitos caminhos de Santiago. Nesta rota, destacamos as igrejas históricas com uma beleza inigualável. Podemos afirmar que a riqueza desta etapa está na beleza das igrejas que pudemos visitar.

A quarta etapa levou-nos de Cea a Santiago de Compostela. Uma etapa que passou por Taboada, Pontevedra até Santiago. Nesta parte do percurso começamos a encontrar mais peregrinos, tanto de bicicleta como a pé, vindo dos quatro cantos do mundo. Recordo-me de ver peregrinos de Itália, Brasil, Portugal, Sul de Espanha, China, Alemanha e Japão. A chegada a Compostela deu-nos um ânimo de dever cumprido após alguns percalços pelo caminho como as quedas. Em Taboada disseram-nos que na sexta-feira tinham entrado em Compostela 2500 peregrinos. Os albergues estavam cheios e os hotéis lotados. Ainda tivemos de fazer 20 km, de albergue em hotel, de hotel em albergue para conseguirmos arranjar um lugar onde ficar. Não foi fácil mas acabamos por ter sorte.

A quinta etapa levou-nos de Compostela a Finisterra. Um percurso diferente, com centenas de peregrinos a pé, de bicicleta e pela primeira vez vimos peregrinos a cavalo. Percorremos 100km para podermos ir ao ponto da Península Ibérica mais dentro do oceano Atlântico. Valeu a pena percorrer esta etapa porque, assim, fizemos de uma só vez dois caminhos de Santiago de Compostela.

Regressamos a Compostela onde, no dia 15 de agosto, assistimos à missa e vimos o “Bota Fumeiro”. Tanto peregrino em Santiago. As ruas estavam repletas de pessoas. Lemos num jornal que Compostela não tinha alojamento para tanta afluência de peregrinos, uma das maiores enchentes de sempre, segundo nos foi dito por uma vendedora ambulante.

Esta peregrinação é uma memória viva que vai ficar gravada no meu coração. Vai ficar  na memória pelas paisagens vistas, as igrejas e capelas visitadas, as ruínas encontradas que mais pareciam sentinelas vigilantes que nos guardaram durante todo o percurso.

Mário Rodrigues

Professor de E.M.R.C.



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